Subscrição de ações: O caso Telesc e os desafios do perito economista em demandas do setor de telefonia

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O Perito Economista é o profissional capacitado para atuar em demandas que envolvem o mercado acionário. Entre as atividades inerentes à profissão de Economista, segundo o Conselho Federal de Economia, estão o “estudo e análise de mercado financeiro e de capitais e derivativos”.  Por conta disso, é comum a atuação do Economista como perito do Juízo em ações relacionadas com a diferença na subscrição de ações de companhias telefônicas. Mas, qual o papel do perito economista nestes processos?

Para responder esta questão, vamos primeiramente relembrar a história para compreender como o perito economista agrega seus conhecimentos — não apenas a base teórica como ainda sua experiência prática — para contribuir de forma célere com o Juízo, oferecendo segurança e imparcialidade para a tomada de decisão do julgador e evitando prejuízos de ordem financeira a qualquer das partes.

Telefone era artigo de luxo nas décadas de 80 e 90

As primeiras demandas judiciais sobre a possibilidade de existirem diferenças acionárias nos “contratos de participação financeira” surgiram no Rio Grande do Sul, no início dos anos 2000. Estas demandas judiciais defendiam que havia uma diferença entre o valor que foi aportado (integralizado) na companhia telefônica local (no caso, a CRT) e a quantidade de ações que foi capitalizada ou entregue ao então, promitente assinante.

Nas décadas de 80 e 90, telefone fixo era artigo de luxo, exigindo programação financeira, disposição para entrar na fila e sorte de conseguir uma das poucas unidades ofertadas via plano de expansão (PEX). O telefone era um bem que inclusive constava nas declarações de Imposto de Renda e comumente era alugado, gerando renda para alguns sortudos que possuíam mais de uma linha.

Ocorre que a demanda reprimida (pois a procura por linhas era superior à oferta) fazia com que os interessados, apesar de desejarem “comprar” um telefone, fossem obrigados a, primeiramente, se tornarem sócios das empresas de telefonia. Somente após isso, poderiam desfrutar da possibilidade de possuírem uma linha telefônica. Dessa forma, quem se inscreveu e conseguiu ser sorteado, firmava com as companhias telefônicas regionais (Telesc, Telepar, CRT, Telesp, entre outras) os chamados “contratos de participação financeira”, pelos quais aportava recursos na companhia Telefônica, em tese, suficientes para a criação da infraestrutura necessária para a instalação do seu terminal.

Uma vez que integralizaram recursos na companhia, tal como ocorre quando se abre uma empresa, tornavam-se também sócios da mesma. Assim, recebiam como contrapartida participação acionária compatível com o aporte realizado. A companhia telefônica, por sua vez, obtinha vantagem fiscal pelo fato de não vender a linha telefônica, mas sim, por permitir que um novo interessado se tornasse sócio da mesma e aportasse recurso nela. Ou seja, contratualmente não havia a venda de uma linha telefônica, mas sim, o direito do novo sócio da empresa (portanto acionista) de ser proprietário de uma linha após aportar recursos nela.

Mas então, qual foi o problema que levou milhares de pessoas a justiça?

O problema, segundo decisão sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), súmula 371, foi que apesar dos acionistas terem integralizado recursos em um momento específico, as companhias telefônicas fizeram a conversão de sua participação acionária apenas futuramente. E ainda, segundo o STJ, isso era feito, sem que fosse corrigido o capital investido na mesma ou ainda, utilizando como base o referencial acionário (VPA – Valor Patrimonial da Ação) do momento da integralização.

Para melhor compreensão, leia o exemplo compartilhado pelo perito André Zambon, da Zambon Perícia & Avaliação, que atua  como Perito do Juízo neste tema desde 2011:

“João” firmou um contrato de participação financeira com a Telesc em janeiro de 1987, tendo pago uma importância no ato à companhia telefônica. Naquele dia, as ações da empresa, ou seja, o VPA, valia “Y”. Independentemente da linha telefônica, a Telesc recebeu os valores do Contratante com a obrigação de futuramente retribuir o promitente assinante com ações da empresa. Porém, neste exemplo, realizou esta operação apenas em junho de 1988, quando utilizou como base o valor pago, mas utilizou como divisor um VPA ajustado/corrigido para aquela data.

Como o perito economista auxilia os Juízes e as Juízas

Os processos sobre a existência de eventual diferença na subscrição de ações envolvem um vocabulário e um conjunto de procedimentos associados ao Mercado de Capitais e, portanto, ligado a área de formação do Economista, que tornam a liquidação destes processos, um tanto quanto complicada. E isso, como já destacado no blog da Zambon, pede o auxílio de um perito profissional, com formação em economia e devidamente credenciado para atuar na área.

Dessa forma, nesta demanda específica e, após a concretização da decisão de mérito, a nomeação de perito do Juízo vem contribuindo de forma capital e célere para a conclusão da lide pelos Julgadores. Isto porque além do uso de um vocabulário, com conceitos poucos utilizados no Direito, tais como ágio, desdobramento de ações, grupamento acionário, juros sobre o capital próprio, capitalização, integralização, subscrição, split e outros, os Juízes e Juízas precisam ter o auxílio de Perito Economista a fim de compreenderem de forma mais clara e também imparcial, as peculiaridades do tema pelo viés econômico-financeiro.

Também se faz necessária a participação do perito do Juízo para o mesmo possa auxiliar o Juízo a delimitar as pretensões das partes aos exatos contornos da decisão de Mérito então existente, impedindo assim que a exploração de termos e conceitos econômicos na etapa de liquidação pelas partes, possa procrastinar a demanda. Somente um perito Economista, com experiência no Mercado de Capitais, poderá colaborar tecnicamente com o Magistrado e com a Magistrada a fim de apurar, nos limites do Julgado e com total imparcialidade, se verdadeiramente existem valores a serem indenizados e, em caso positivo, quantificar estes valores e, com isso, evitar prejuízos de ordem financeira a qualquer das partes.

Por fim, necessário ainda grifar que o STJ já se pronunciou no sentido da nomeação de perito Economista para tal finalidade em março de 2009, quando apontou:

CÁLCULO DA DIFERENÇA DE AÇÕES. QUANTIDADE. Deve ser apurado mediante liquidação por arbitramento com participação de perito especializado em valores mobiliários. As alterações do valor patrimonial da ação não têm qualquer relação com os índices oficiais de correção monetária (STJ – RECURSO ESPECIAL Nº 1.055.914 – RS (2008/0101728-8) RELATOR: MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA j. 04 de março de 2009).

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