A perda de um ente familiar representa, além do luto, a obrigação de iniciar o processo de inventário e partilha dos bens, seja pela via extrajudicial ou judicial.
No inventário extrajudicial, a Resolução CNJ nº 35/2007 determina, em seu art. 11, a obrigatoriedade da nomeação de uma pessoa interessada na escritura de inventário e partilha lavrada em cartório. Esta pessoa será o inventariante, a quem caberá a representação legal do espólio e a condução de todos os atos vinculados à sua administração.
No âmbito judicial, o Código de Processo Civil (CPC), por meio dos incisos do art. 617, estabelece a ordem de preferência para a nomeação do inventariante: inicialmente o cônjuge ou companheiro(a), depois um dos herdeiros e, em seguida, o testamenteiro. No entanto, podem haver caracteristicas do espólio que impeçam essas alternativas, como quando há conflitos entre os herdeiros, grande volume e diversidade de bens, ou negócios empresariais ativos que precisam de gestão técnica e continuada durante o inventário.
Exemplos como estes podem exigir a nomeação de um inventariante judicial (ou dativo), figura que assume relevância estratégica no processo. Sua função encontra amparo nos arts. 617, inciso VII, e 618 do CPC, sendo responsável por representar o espólio ativa e passivamente, em juízo e fora dele, além de administrar os bens como se fossem seus, com zelo e responsabilidade.
A nomeação pode ser feita diretamente pelo Juízo, ou com a sua aprovação se indicado pelas partes. O inventariante judicial deve ser pessoa de confiança do Juízo, tecnicamente capacitada, imparcial, com experiência e tempo hábil para cumprir, de forma diligente, os atos processuais. O objetivo principal é garantir eficiência, imparcialidade e segurança jurídica ao andamento do inventário, especialmente nos casos de alta complexidade.
O Papel da Perícia na Gestão do Espólio
É neste contexto que se evidencia a importância da perícia técnica, sobretudo nos inventários com características patrimoniais e empresariais complexas.
A partir da nomeação, o inventariante deve apresentar, em até 20 dias, um relatório inicial contendo a descrição do acervo patrimonial, os direitos e obrigações do espólio. Essa tarefa, embora aparentemente administrativa, demanda rigor técnico, conhecimento contábil, fiscal, jurídico e, muitas vezes, apoio especializado de peritos para:
- Avaliação de bens móveis e imóveis com metodologias reconhecidas;
- Apuração de haveres societários, quando o falecido era sócio de empresa;
- Reconciliação bancária e patrimonial, para identificar ativos não declarados ou dívidas ocultas;
- Análise de demonstrações contábeis, em caso de sociedades ou bens empresariais;
- Investigação de passivos fiscais, trabalhistas e cíveis vinculados ao espólio;
- Estudo de viabilidade da manutenção ou liquidação de ativos produtivos, como empresas em operação.
Nestes cenários, o inventariante que atua em parceria com peritos contábeis e avaliadores judiciais agrega segurança técnica à sua gestão, aumenta a transparência do processo, minimiza litígios entre os herdeiros e contribui diretamente para a celeridade da partilha. A perícia, portanto, deixa de ser apenas um suporte eventual e passa a integrar o núcleo estratégico da condução de inventários judiciais complexos.
Responsabilidades, Relatórios e Prestação de Contas
Ao longo do inventário, o inventariante judicial poderá ser demandado a apresentar diversos relatórios complementares, contendo certidões, avaliações, prestação de contas e notas explicativas. A clareza, fundamentação técnica e aderência às normas jurídicas e contábeis desses documentos têm impacto direto na aceitação judicial e na redução de objeções por parte dos herdeiros ou do Ministério Público.
Assim, a atuação pericial associada ao inventariante é também elemento-chave para mitigar riscos de responsabilização futura, pois decisões como venda de bens, pagamento de dívidas ou administração de empresas serão amparadas por laudos técnicos e pareceres fundamentados, reduzindo o grau de subjetividade das escolhas.
Remuneração e Reconhecimento da Complexidade
Quanto maior o patrimônio, mais elevada será a responsabilidade do inventariante judicial. Por essa razão, a remuneração devida deve refletir não apenas o valor econômico do espólio, mas também o grau de dificuldade técnica, o número de atos processuais envolvidos, e o tempo necessário para sua condução. Essa contraprestação é fixada judicialmente, normalmente em percentual sobre o acervo.
É comum que a fixação dessa remuneração cause desconforto entre os herdeiros. Contudo, é fundamental compreender que a gestão qualificada do espólio — com apoio de profissionais especializados e produção de relatórios periciais — promove ganhos significativos em tempo processual, reduz disputas e fortalece a pacificação social e familiar por meio de uma partilha técnica, justa e equilibrada.
A atuação do inventariante judicial, em especial nos casos mais sensíveis e com grande complexidade patrimonial, exige mais do que conhecimento jurídico: demanda gestão estratégica, tomada de decisão fundamentada e, sobretudo, suporte técnico multidisciplinar.
Nesse cenário, a perícia contábil, financeira, econômica e de avaliação torna-se indispensável, não apenas como meio de apuração de valores, mas como instrumento técnico-jurídico capaz de conferir legitimidade, agilidade e segurança à administração do espólio.
Assim, pode-se afirmar com convicção que o sucesso da condução do inventário judicial — e a harmonia futura entre os herdeiros — passa necessariamente pela atuação articulada entre inventariante e peritos especializados, sendo esta uma das mais eficazes estratégias para garantir justiça, equilíbrio e efetividade ao processo sucessório.





















