As demandas econômico-financeiras complexas e peculiares requerem do perito economista não apenas uma sólida base teórica, mas também uma vasta experiência prática. Um exemplo notável é o trabalho pericial nas ações de devolução do Empréstimo Compulsório da Eletrobras.
O empréstimo compulsório da Eletrobras foi instituído pela Lei nº 4.156/62, com o objetivo de ampliar os recursos da União destinados ao investimento na expansão do setor elétrico nacional. Esta lei foi regulamentada pelo Decreto-Lei nº 1.512/76, que exigia das empresas com consumo superior a 2.000 kWh um percentual sobre o valor faturado, chegando em determinado período a 32,5% do valor da conta de energia. Esses valores eram lançados e cobrados mensalmente na mesma fatura emitida pela concessionária de energia. Assim, o empréstimo compulsório arrecadava recursos significativos das empresas, com a obrigação de devolver os valores percebidos em até 20 anos, com correção monetária e juros de 6%, pagos anualmente em dinheiro ou compensados na conta de energia.
O Decreto-Lei nº 1.512/76 e o Decreto nº 81.668/78 previam que os créditos dos consumidores seriam constituídos apenas em 1º de janeiro do ano seguinte ao dos recolhimentos. Dessa forma, os recolhimentos realizados ao longo de 1987, por exemplo, seriam creditados no início de 1988, sem correção monetária durante o ano de recolhimento. Considerando que a inflação de 1989 foi de 1.972,918%, conforme dados do site Global-rates, a ausência de correção monetária causou um impacto significativo.
Origem das Ações Relacionadas ao Empréstimo Compulsório da Eletrobras
Os recolhimentos do empréstimo compulsório sobre o consumo de energia elétrica vigoraram entre 1976 e 1993. A origem das ações judiciais reside na falta de correção monetária ao longo do ano. Como ilustrado por André Zambon, sócio da Zambon Perícia & Avaliação e perito com vasta experiência no assunto:
“A ‘indústria Z’ recolheu o empréstimo compulsório, lançado de forma automática e proporcional ao seu consumo, na fatura de energia elétrica de janeiro de 1989. No entanto, apenas em janeiro de 1990 a Eletrobras reconheceu o valor nominal recolhido pela ‘indústria Z’ um ano antes, convertendo-o em crédito do empréstimo compulsório em uma moeda própria denominada UP. Isso significou que toda a inflação daqueles 12 meses foi desconsiderada. Em dezembro de 1989, a perda inflacionária seria de ‘apenas’ um mês, mas como o IPC naquele mês foi de 51,50%, só nesses 31 dias o consumidor perdeu metade do valor pago.”
Consequentemente, a falta de correção monetária resultou na devolução incorreta dos créditos. Os índices de atualização monetária, indispensáveis devido aos períodos de inflação galopante e aos sucessivos planos econômicos, inclusive com trocas de moedas, foram simplesmente desconsiderados.
Após o pagamento do empréstimo compulsório e a consequente transferência de recursos das empresas para a Eletrobras, esses valores eram convertidos em uma moeda própria da Eletrobras, denominada UPs (unidade padrão). Assim, tanto os juros de 6% ao ano pagos em dinheiro, quanto as ações fruto das conversões realizadas e os créditos a serem convertidos, permaneceram aquém da realidade monetária imposta pela hiperinflação e pelos reajustes econômicos ocorridos durante a vigência do compulsório.
O Papel do Perito Economista
Com a consolidação do entendimento pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2009, os consumidores que ingressaram com ações enfrentaram grandes dificuldades na fase de execução de sentença, mesmo obtendo decisão favorável quanto à necessidade de reposição da correção monetária no período do empréstimo. A complexidade da matéria, que envolve elementos econômico-financeiros e aspectos do Mercado de Capitais, dificulta a localização de peritos familiarizados com o tema.
Assim como nas demandas de ressarcimento das ações da Telesc e outras companhias de telefonia, o perito economista é o profissional capacitado para atuar como assistente técnico das partes ou como perito do Juízo. A perícia visa recompor o que foi recolhido para ser devolvido, levantando todas as informações e realizando os cálculos necessários para atestar e pagar as perdas decorrentes da falta de correção monetária no período. Como parte daquele crédito foi convertida em ações da própria Eletrobras, o domínio dos aspectos relacionados ao mercado de capitais é uma exigência sine qua non para qualquer perito que pretenda auxiliar o Juízo ou as partes neste tipo de demanda.